quinta-feira, 10 de outubro de 2013

Regulação Financeira

Em 13 Bankers, Simon Johnson e James Kwak descrevem um acontecimento no final dos anos 90, quando o Larry Summers, então no Tesouro, ligou para a Brooksley Born, a então chefe da Commodity Futures Trading Commission, e disse: “I have 13 bankers in my office and they say if you go forward with this you will cause the worst financial crisis since World War II.” O final da história já é conhecido: o setor financeiro continuou desregulado e a sua ampliação, juntamente com suas inovações, foi uma das grandes causas da crise financeira iniciada em 2007.

Passados cinco anos do início da crise, observa-se que os avanços na regulação financeira ainda são muito pequenos. 13 Bankers tenta mostrar justamente a influência do setor financeiro na Casa Branca. Segundo o livro, o setor financeiro seria a nova oligarquia americana, em comparação com aquela formada pelos gigantes industriais (maioria ligados a J. P. Morgan) no fim do século XIX. Um outro episódio com 13 banqueiros, desta vez com Obama, ilustra bem esse fato: em uma tarde de março de 2009, governo disse, após reunião com a turma, que ele e os bancos estavam juntos. Os bancos precisavam do Estado, e muito. Mas porque o Estado precisava tanto da boa vontade destes bancos? 

Assim, o fato é que a indústria financeira continua atuando nos bastidores para que nada, ou muito pouco, seja feito. Esse pelo menos é o diagnóstico de outros importantes livros sobre a crise lançados nos últimos anos, como por exemplo, o Freefall do Stiglitz.

Admati e Hellwig, em New Bankers Clothes, compartilham da mesma visão e discutem medidas para a regulação. A medida singular mais efetiva é simplesmente o aumento do capital próprio dos bancos, para algo em torno de 20% a 30%. Dizem ainda que nunca ouviram nenhum argumento consistente contrário a essa medida. O setor financeiro defende que a exigência de muito capital aumenta os seus custos e diminui a eficiência do setor, mas o fato é que se existe alguma redução de custo em usar uma alta alavancagem, ela ocorre justamente pelo seguro grátis que recebem da sociedade, já que o governo na maioria das vezes entra salvando um banco em falência. Fazer com que bancos coloquem mais capital próprio em seus investimentos certamente traria mais prudência e alinhamento de incentivos.

Os autores colocam que antes dos anos 80, a regulação financeira focou mais em liquidez do que exigência de capital. Embora seja necessário que a regulação também olhe para a liquidez, no limite, problemas de liquidez podem (e devem) ser resolvidos por um emprestador de última instância. A lógica é que se o ativo é bom e só está sub-avaliado devido a um excesso de vendas, esse emprestador pode comprar e depois revender. O detalhe é que ele deve ser público. Em 1907, lembram os autores, esse papel foi exercido pelo J. P. Morgan em pessoa. Mas quando se trata de um ente privado, sempre acaba havendo conflito de interesse (em relação aos negócios do grupo).

Outras medidas urgentes seriam melhorar a transparência das instituições, facilitando o trabalho de reguladores e público em geral. O diagnóstico é que foram desenvolvidas contabilidades criativas para manter muitas contas fora do balanço e isso deve ser coibido através de penalidades. Ativos e passivos que se cancelam são o foco principal. Outro ponto importante é relacionado à ponderação de ativos pelo risco em fórmulas de exigência de capital, que talvez não determine incentivos corretos. Pode gerar racionamento de crédito para determinados segmentos e repacotamento de ativos, transformando em títulos com maior rating. Quando uma classe de ativos acaba incorretamente categorizada como segura, pior ainda. Pode induzir um aumento de risco em momentos em que a falência já é certa, já que o banco ganha incentivos para se alavancar ainda mais. 

Um outro livro, Slapped in the Face by the Invisible Hand, de Gary Gorton, explica bem o que houve durante a crise: uma corrida de bancos aos bancos, ao invés do público aos bancos, no repo market. Com um enorme shadow banking system e vários produtos financeiros criativamente criados, desconhecidos de grande parte do público e até de muitos economistas, essa interpretação simples ficou difícil de verificar, mas foi exatamente o que aconteceu, por meio da subida de haircuts naquele mercado sob pânico. O choque foi justamente o momento em que o preço dos imóveis começou a cair. Gorton também tem suas sugestões de regulação. Dentre elas, maior supervisão à securitização e entrada limitada na securitização (buscando garantir a insensibilidade à informação da dívida – colaterais – e a entrada do shadow banking para a órbita da regulação).

Assim, no que se refere à regulação do setor financeiro, pouco foi feito. Mas não tão pouco para Alan Blinder, em seu After the Music Stopped. Resenha do NYT diz que “Blinder is also fairly satisfied with the controversial Dodd-Frank Act of 2010 that overhauled American financial regulation — although perhaps his praise is largely a reflection of his low expectations. He does not think Dodd-Frank will make financial crises a thing of the past, and is not even sure it will make them rarer. However, Blinder claims, it should reduce the severity and costs of future financial excesses”. Como não li o livro, não posso ir além. Mas talvez Blinder só não ache mesmo que a evolução da regulação financeira (por meio do Dodd-Frank Act) tenha sido tão ruim por causa de suas baixas expectativas em relação a ela. Lembre-se dos 13 banqueiros.

quarta-feira, 9 de outubro de 2013

Sobre o Nobel de Economia

Será anunciado na segunda feira agora... Apostas podem ser feitas no Economista X.

Sobre o PIB

Hoje o FMI divulgou seu trimestral WEO, cuja chamada foi "Global growth is still in low gear and the drivers of growth are shifting, says the IMF’s latest World Economic Outlook (WEO) report. The IMF forecasts global growth to average 2.9 percent in 2013—below the 3.2 percent recorded in 2012—and to rise to 3.6 percent in 2014."

Para o Brasil, a previsão é de um crescimento de 2,5% em 2013 e 2014. O detalhe é que 3 meses atrás a previsão para o crescimento de 2014 era de 3,2%. A perda de confiança está se generalizando.

Sobre a PNAD

Como todos já devem estar carecas de saber, o IBGE divulgou, na semana passada, os resultados da PNAD de 2013. Mais uma vez, um resultado que vem se repetindo nos últimos anos: renda crescendo mais do que o PIB. Prato cheio para uma boa polêmica.

Na sexta-feira, o Marcelo Neri, com uma "euforia ministerial" (palavras do Bacha), reverenciou bastante os resultados da pesquisa em uma coluna no globo:


Foi prontamente respondido pela Monica de Bolle, no seu tom elevado como sempre (nova Schwartzman?), mas com certa razão:


Por fim, hoje o Bacha escreveu uma esclarecedora coluna, onde explica exatamente as possíveis razões do descolamento entre renda e pib per capita: 

"Caberia, antes de tudo, entender por que os dados da Pnad destoam tanto daqueles do PIB. Tarefa para profissionais, diria o Neri! Infelizmente, os profissionais andam batendo cabeça a respeito desse assunto. Alguns acham que o PIB está subestimado. Outros acham que se trata de conceitos distintos de renda real, pois a renda da Pnad é corrigida pela inflação (INPC) e o PIB é corrigido pelo chamado deflator implícito. Outros notam que o PIB é um conceito muito mais amplo que a renda das famílias na Pnad e que a comparação deveria ser feita, não com o PIB, mas com o consumo das famílias nas contas nacionais. Outros salientam que a Pnad apenas pergunta às pessoas qual foi sua renda em setembro de cada ano, enquanto que o PIB engloba uma massa muito maior de informações e cobre o ano inteiro. Há, finalmente, a questão do salário mínimo, cujo valor real vem sendo reajustado bem acima da inflação há alguns anos. É possível que a renda reportada pelas pessoas à Pnad seja muito influenciada pelo valor do mínimo legal e supere os ganhos financeiros que elas de fato auferem, especialmente quando transitam da informalidade para a formalidade. A evidência de o consumo das famílias nas contas nacionais não acompanhar o crescimento da renda da Pnad seria um indício dessa superestimação."

Mesmo sem uma resposta definitiva em relação a essa divergência, o certo é que, sem crescimento do PIB, o processo de elevação da renda visto nos último anos está realmente se esgotando. E mais certo ainda é que esse tema voltará e muito durante a corrida presidencial, que já se inicia. A conferir....

sexta-feira, 4 de outubro de 2013

Mercado de Trabalho

Um interessante seminário do IBRE aconteceu ontem na FGV, com o objetivo de discutir o panorama do mercado de trabalho. Os slides podem ser obtidos no link acima, mas acho que a visão geral pode ser compartilhada aqui. 

De maneira geral, os expositores mostraram a evolução do mercado na última década. Até aí, nada de novidade: (i) queda do desemprego, (ii) queda da informalidade, (iii) aumento do rendimento real e (iv) aumento da escolaridade. O crescimento das vagas acima do crescimento da PEA reduziu a ociosidade no mercado de trabalho e o desemprego atingiu as suas mínimas históricas recentemente (o dado de agosto da PME é de 5,3%). O rendimento real teve um crescimento acima da produtividade. 

Apesar desses resultados positivos na fotografia, na margem, entretanto, o mercado de trabalho pode estar se estabilizando (na melhor das hipóteses) ou entrando em uma tendência de baixa (embora bem leve, já que as apostas mais pessimistas não passam 6% de desemprego). Essa tendência seria explicada pela evolução do desemprego, que em 2013 não é muito diferente de 2012, pelos dados de geração de emprego do CAGED, pelos índices de ocupação e de remuneração aproximadamente estagnados. Mesmo com essa deterioração, entretanto, os efeitos demográficos vão contribuir para a manutenção do baixo desemprego. 

Uma questão interessante, que já vinha sendo discutida há um tempo, é que nos últimos dois anos houve baixo crescimento econômico, mas o desemprego continuou nas mínimas históricas. Em princípio, isso contrariaria a Lei de Okun. Assim, qual seria a explicação para esse paradoxo aparente? Aqui a resposta passa pelo avanço maior do setor de serviços (mais intensivo em mão de obra) e uma desaceleração do crescimento da PEA. Outra hipótese levantada foi em relação à existência de retenção de trabalho (labor hoarding), mas os expositores a rechaçaram, pois essa retenção poderia ocorrer apenas num curto prazo e não em um prazo de mais ou menos 2 anos.

Fora essas questões conjunturais, o Gabriel Ulyssea, do IPEA, trouxe 4 pontos bastante interessantes: 

1. Existe falta de mão de obra qualificada? Não. 
2. Estamos no pleno emprego? Não. 
3. Emprego na indústria. 
4. Salário mínimo e desigualdade de salários. 

Em 2, o mais interessante é verificar que a taxa de participação ainda é baixa, especialmente entre as mulheres. Destaca-se ainda uma queda da taxa de participação desde 2009 entre os jovens de 15 a 24 anos: o problema é que ainda é alto o número desses jovens fora da PEA e também fora da escola. Em todo caso, a conclusão é que ainda há espaço para aumentar a oferta. 

Para os outros pontos, vale a pena dar uma olhada na sua apresentação.

Para o futuro, sempre vale lembrar: a PEA está se desacelerando e começará a se reduzir mais ou menos em 2030. É importante, para o crescimento, portanto, que o país direcione esforços para o aumento da produtividade.

sexta-feira, 20 de setembro de 2013